Suspirou, impaciente, vendo a fila
andar lentamente, pensando consigo mesma que os caixas só eram rápidos no nome.
Girou os olhos, trocando de novo a perna de apoio, desejando poder cruzar os
braços, mas não queria amassar os salgados dentro do saquinho, nem congelar o
braço por causa da garrafa gelada de Sprite. Queria ir logo pra casa, trocar o
uniforme por alguma roupa confortável e fresca, e jogar a mochila em qualquer
canto.
Quando finalmente chegou a sua vez,
estava começando a se arrepender de passar no Hiper Moreira ao invés de ir
direto pra casa. Enterrou esse arrependimento no fundo da mente ao lembrar que
provavelmente teria de cozinhar algo se não tivesse feito o que fez.
Pagou o petisco que se passava por
almoço, saiu e foi caminhando em direção à própria casa enquanto bebia o
refrigerante e atirava as cochinhas e empadas na boca, agradecendo mentalmente
que o tempo na fila não fora suficiente para que esfriassem.
Passou por uma senhora negra. Devia
ter setenta ou oitenta anos, era impossível saber, pois além dos cabelos
grisalhos, algumas rugas e as costas ligeiramente encurvadas por culpa da
gravidade e do cansaço, nada mais indicava de fato a passagem do tempo. Os
olhos, cinzentos, eram brilhantes e inteligentes, e a garota se viu sorrindo
automaticamente, lembrando de uma velha senhora também negra que fizera parte de
sua criação, antes de morrer devido à complicações médicas depois de quebrar a
bacia. As duas possuíam aquele mesmo ar inteligente, perspicaz, atento e
altivo. Carregava diversas sacolas.
Movendo-se rapidamente, guardou a
garrafa e o saco de salgados na sacola do supermercado e se aproximou
cautelosamente da senhora.
— Com licença... Gostaria de ajuda?
– perguntou com cuidado. Já conhecera outros idosos orgulhosos que reagiam de
forma ligeiramente violenta quando perguntados se desejavam ajuda.
A senhora parou de andar e fixou os
olhos cinzentos na garota que lhe oferecia ajuda. Era mais alta que ela, com um
tipo físico fofo, um cabelo castanho escuro preso num rabo de cavalo alto com
uma franja ligeiramente estranha caindo pela lateral do rosto. Os olhos eram de
um castanho chocolate, brilhantes de curiosidade e carinho no meio do rosto de
pele branca, bochechas fofas de bebê e lábios grossos e vermelhos. Os braços e
o colo, um pouco escuros pelo sol. Deixou as íris dançarem rapidamente pelo
uniforme do colégio militar – uma calça marrom escura de taquetel, tênis preto
e uma camiseta de um marrom meio pastel que garantia aos alunos o apelido geral
de Paçoquinhas – e se fixou no nome bordado do lado direito do peito.
Abriu um sorriso.
— Aceitaria sim, criança... – imediatamente
a garota se movimentou para pegar as sacolas de uma das mãos da senhora. – Sou
Teresa. E a mocinha? – ela tinha lido o nome. Mas seria falta de educação
usá-lo sem que ela se apresentasse.
A garota sorriu de volta.
— Arely. Mas se quiser, pode me
chamar de Ly.
Teresa inclinou levemente a cabeça,
o cenho se franzindo muito suavemente para que se percebesse.
E pensou no que precisaria fazer
para garantir que o Espírito que seguia Arely fizesse a passagem que devia ter
feito quinhentos anos atrás...
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Mande beijo pra mãe, pra tia, pro namorado(a), pro cachorro, pro passarinho, dance cancan, enfim, fique a vontade, a dimensão é sua.
Syba: Mas não faça piada do meu cabelo... u.ú
Gabi: Tá, tá... ¬¬