Dimensões

21 outubro 2017

Jogos: Vozes e Escuridão

E aí, pessoas?!

Ando sumida, eu sei, a vida de estudante de RI, mba, dois idiomas e Krav Maga, escrita e desenho é meio insana e meio "Socorro, o que faço?!". Peço mil desculpas por isso. O blog nunca irá ser desativado, mas que vai ser sempre um ritmo meio tartaruga, isso será. Mas prometo que não vai parar e inclusive tenho algumas ideias bem interessantes de matérias relacionadas à construção de mundos. Aos poucos vocês continuam ouvindo de mim.

Mas vamo que vamo.

A postagem de hoje é especial num certo nível. Mais uma postagem para a coluna de jogos, com uma estrela muito especial e que deu o que falar: Hellblade Senua's Sacrifice.

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A Polêmica

Produzida pela Ninja Theory, mesma produtora do último Devil May Cry lançado (aquele do Dante revoltado de cabelo preto :P), o jogo virou notícia e viralizou em grupos e sites de games por conta da teórica possibilidade afirmada pela produtora de que o save podia ser permanentemente excluído - e assim o jogador teria de recomeçar o jogo - caso Senua, a protagonista, morresse muito. Ou seja: muita gente que não passou pelo terror da não-existência de memorycard e similares ficou revolts.

Por que teórica possibilidade? Porque, aparentemente de acordo com alguns jogadores que fizeram testes, não, o save não é excluído permanentemente; entretanto, a protagonista acredita que vai morrer/pirar de vez eventualmente, então essa tensão de "exclusão do save" foi usado para ajudar na imersão do jogador.

Mas peralá que acho que confundi vocês. Vamos por parte e falar do jogo em si e de sua história e gameplay, extremamente entranhados entre si e com essa "notícia" de exclusão de save para entregar uma experiência única e marcante.

A História
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Tudo começou com a morte de Dillion, amado de Senua, nas mãos dos Vikings - chamados ao longo do jogo de "Northernman". Com tanto Senua como Dillion sendo celtas/pictos (sou ruim de identificar), essa morte significa que a alma de Dillion está em Hellheim, o mundo dos mortos nórdico. Usando das memórias de Druth, um homem que foi prisioneiro dos Vikings e que contou tudo sobre os deuses nórdicos para Senua, nossa protagonista parte para as terras dos Homens do Norte, atrás da entrada de Hellheim com o objetivo de resgatar a alma de seu amado.

E é essa jornada, da chegada ao portão de Hellheim até a batalha contra Hell pela alma de Dillion, que percorremos. Sempre acompanhados das vozes. O que são as vozes?

Senua ouve vozes. Diversas, sempre falando em frases e tons diferentes, mais intensas e frequentes e sobrepostas em batalhas, onde tanto dão avisos e incentivam ou zombam de Senua. Quando comecei o jogo e elas iniciaram - eu não sabia de suas existências - fiquei extremamente surpresa e foi algo que me agradou a ponto de surtar sobre o assunto no facebook, falando sobre como era exatamente aquilo que eu imaginara para Arely em "Arely A Mensageira" (TO REESCREVENDO).

Essas vozes estão ligadas à escuridão, algo indizível dentro de Senua e que também estava em sua mãe, uma maldição dos deuses. E é isso, essa escuridão, a razão da crença de Senua sobre sua morte: cada morte dela é uma espécie de visão, e o trauma de experimentar a morte permite o avançar da escuridão.

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Essa escuridão é representada fisicamente: quando Senua tenta abrir o portão de Hellheim, homens do norte a atacam e ela morre, pela primeira vez, e ao voltar, a marca está em sua mão direita, negra e venosa e subindo pelo braço; a cada morte, ela sobe mais, e quando alcançar a cabeça de Senua, ela enlouquecerá. E é aqui que entra a crença de exclusão do save.

Conforme o jogo corre, com Senua enfrentando servos de Hell - destaque para a batalha do terceiro boss, Garm, e o percurso até ele, que para a cagona aqui foi um pesadelo -, encontrando runas que reativam suas memórias sobre o que Druth lhe contou, relembrando e enfrentando os acontecimentos de seu passado - a infância abusiva com o pai por conta da escuridão, quando conheceu Dillion, o momento em que achou seu corpo e tantas outras -, passamos a notar melhor a sutiliza da história e percebemos o que exatamente é a escuridão: esquizofrenia/psicose. É algo que podíamos presumir devido aos avisos no começo do jogo, sobre a produtora ter consultado psiquiatras e psicólogos, mas ainda assim, ele desenvolveram de tal forma que é ao mesmo tempo fantástico e real e óbvio e não tão óbvio. É a medida certa.

Sob essa ótica, essa nova percepção, passamos a entender melhor Senua e o universo apresentado, nos fazendo perguntas e ligando as peças, até que o jogo culmina num final que considerei magnífico que eu não esperava de todo e me fez chorar. Muito.


A Construção do Universo
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Hellblade é incrível. Usou e abusou de mitologia nórdica em sua construção, incluindo o relativamente desconhecido Garm, o lobo de gelo de Hell, a espada despedaçada de Sigurd, e uma ambientação incrível e tensa do submundo onde as almas estão chorando e estendendo suas mãos para agarrar Senua e seus rios de sangue, de forma que criou algo sólido e acreditável e lindo, em gráficos e em conceito - porque, é um fato, os gráficos foram incrementados à história para contá-la junto da parte mais narrativa.

Os inimigos - desde os homens do norte até a própria Hell - foram muito bem conceituados e até arrepio com como Hell tem um rosto impassível, de deusa, de imortal. Os cenários também são lindos, com destaque total para o submundo de fato e para os puzzles que temos de resolver para avançar no cenário, o que deixou a jogabilidade bem variada e divertida.

E chamo atenção para a captura de movimento e animação usada para Senua: ela é a única personagem além de Hell que vemos seu rosto claramente, sem máscaras ou sem algo meio nebuloso de memórias, e cada momento, de memórias a batalhas a momentos onde Senua está para morrer, vemos claramente as expressões faciais dela, tudo que ela está sentindo - dor física e principalmente emocional - estampado e contando toda uma história por si só.

E a história, claro. Cuidadosamente construída, com cada diálogo, lembrança e cenário trabalhando de forma coesa e simbiótica para tentar nos passar como Senua se sente - salas cujas entradas somem, veias de escuridão cobrindo o ambiente, as vozes sempre presentes, os momentos onde a escuridão impera e Senua precisa confiar em seus outros sentidos para avançar (eu quase tive um piripaque nessas partes). E conseguindo: nos tornamos Senua.

Tudo isso junto transformou o jogo numa obra de arte. Foi uma experiência intensa e sentimental e marcante que pretendo repetir uma vez a cada seis meses. Fiquei quase um mês de ressaca gamer, incapaz de jogar qualquer coisa, mas por uma boa razão.
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Um monte de imagens da Senua diva S2

Bônus
A ending song, durante os créditos, é maravilinda, combina perfeitamente, e dá ainda mais vontade de chorar. Recomendo mil vezes S2




Bônus 2
Apesar de eu ter AMADO o jogo, devo destacar que existem outras opiniões que achei muito válidas. Acrescento aqui o link para um artigo escrito por alguém que sofre com doença mental (pelo que percebi, não especificou qual), que encontrei enquanto procurava imagens para o post. Está em inglês, mas acho extremamente válido divulgar esse tipo de perspectiva, e senti um tabefe mental lendo o texto.

Esse texto, incrível, pode ser lido aqui.

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Syba: Mas não faça piada do meu cabelo... u.ú
Gabi: Tá, tá... ¬¬