Dimensões

18 novembro 2012

Arely A Mensageira - Capítulo 4: Fugir

Frio.

Escuro.

Falta de respiração.

Falta de batimentos.

Água.

Água.

Água em todas as direções.

Nada de superfície logo acima.


Sentou-se num pulo, o cabelo grudando-se ao rosto e a camisola ao corpo. Quase podia sentir ainda a pressão da profundidade em seus ouvidos e a água passando pelas vias respiratórias. O coração acelerado, sentindo a pulsação logo abaixo de suas orelhas, lhe dizia que estava viva, que ainda respirava.

Suspirou, lutando para estabilizar a respiração descompassada. Por que estava voltando a ter aqueles pesadelos?

Primeiro, ao encarar os olhos descolorados de Louis. Depois, no mesmo dia, aquele estranho sonho em que as mãos sangravam. E agora, isso. Desde a semana anterior à mudança para Goiânia, quando ainda morava em São Paulo, que não tinha pesadelos tão intensos.

Viu uma réstia de luz penetrar pela cortina, e ao observar, viu que o céu começava a iluminar-se. Era segunda-feira. Passara o que sobrara de seu sábado e boa parte do domingo no hospital, e o resto do domingo conversando com Ruby, que fora embora tarde. E não estava com um pingo de ânimo de sair da cama e encarar os colegas. Na verdade, estava sem coragem alguma era de encarar Louis. Os demais ela suportaria.

Suspirou, relegando um último olhar ao rádio-relógio que marcava seis horas, deu as costas para a luminosidade que se infiltrava lentamente pela janela escancarada, cobriu-se até o queixo e voltou a dormir.

Ela já deveria ter se levantado há no mínimo vinte minutos se quisesse chegar a tempo no colégio mesmo...


Seu coração queria parar, lentamente, perdendo a batalha... Só entrava água ao invés de ar através da traqueia.

Estava quase desistindo de tentar alcançar a superfície.

Quase...

Alguém agarrou seu braço com uma força esmagadora. Mãos grandes. Calejadas. Quase sem perceber, timidamente envolveu o braço do estranho que lhe estendia a salvação com a própria mão. Sentia os músculos definidos e tensos.

E então, quem quer que fosse, a puxou para fora, como se ela não pesasse nada. Como se a água não estivesse tentando reclamá-la para suas profundezas misteriosas, sombrias e solitárias.

Seu peito reclamou o ar desesperadamente, enquanto os olhos buscavam aleatoriamente o rosto daquele que lhe salvara.

O rosto estava borrado por névoa. Apenas os olhos amarelados eram visíveis, brilhantes como faróis. E a sensação de que já os vira latejando em sua cabeça.


Acordou novamente. Dessa vez, o maior culpado era o celular, apoiado em cima do rádio-relógio.

Bufando por ver que eram ainda nove e pouco, Arely esticou o braço para atender o insistente aparelho que tocava “Njord”, do LeavesEyes.

— Alô... – a voz delatava: estava morrendo de sono e só suas boas maneiras fizeram que ela não mandasse quem quer que tinha lhe ligado àquela hora para o Inferno, tomar naquele lugar, o que ele preferisse.

Ly?! Você tá bem?! – a voz estridente de Patrícia. Por que a garota estava tão preocupada com ela? Sequer eram amigas... Apenas alguns trabalhos em grupo.

— Hm-huummmmm... – murmurou, ainda num estado entre o mundo do sono e o mundo desperto. E, sinceramente, ela estava mais para o lado do sono... Provavelmente, apenas um olho no desperto. Se muito. – Por quê? – a voz arrastada. O cérebro lento. Mesmo assim... Tinha coisa ali, ela quase farejava... Patrícia não ligaria durante o período de aula só porque ela faltara um dia. Não mesmo.

É que o Louis disse o que houve no Shopping... Como você está? – a preocupação autêntica.

Inferno, como é que ela conseguira fazer Patrícia se preocupar tanto com ela? Apesar dos trabalhos em grupo, mal se falavam. Só tinham trocado números de celular para facilitar discussões caso houvesse alguma complicação em algum trabalho. E quem tinha dado o direito de Louis contar à garota o que tinha acontecido? Ah, ela o estrangularia na primeira oportunidade que tivesse.

— Estou bem, mesmo...

Então, por que não veio e sua voz está assim?

Arely despertou por completo em questão de milésimos de segundo. O que aquele idiota fazia falando através do celular de Patrícia? Agora, antes de estrangulá-lo, ela o cortaria com arame farpado e então o jogaria numa piscina de álcool. Como ele ousava falar com ela? Não eram nada um pro outro.

— Para sua informação, seu italiano estúpido, perdi a hora. Fui dormir tarde pensando em formas diversas de te matar, e até agora a pouco eu estava dormindo muito agradavelmente...

Sonhando em estar se afogando?— a voz dele era baixa. Obviamente, ele não queria que mais ninguém ouvisse, apenas ela. Havia uma ponta de crueldade, e a hipocrisia abandonada. Ele sabia do que falava. Sabia que era verdade e sabia que tocara num ponto delicado, num ponto que ele sabia que provocaria dor. E ele não ligava, era óbvio que era justamente isso que ele queria.

Arely semicerrou os olhos, sentando-se e jogando as pernas para fora da cama, respirando lenta e profundamente, se controlando para não mandá-lo para o Inferno. Sabia que isso lhe daria o gostinho da vitória. E não permitiria. Não mais.

— De onde tirou isso? – perguntou com a voz o mais tranquila que pôde, parando diante da janela e observando a vizinha idosa sair para caminhar, uma brisa seca entrando pelas grades e atingindo seu rosto.

Ele riu suavemente.

Ora, Arelyel, não minta...

Rangeu os dentes. Odiava que ele a chamasse por seu nome inteiro. Odiava. Odiava.

Respirou de novo.

— Na verdade, eu estava sonhando com um belo Viking que estava me arrastando dessa vida entediante para uma vida cheia de aventuras e saques... Ou algo assim, só lembro das lutas de espadas e machados... – ela controlou-se para não rir ao ouvir o som estrangulado do outro lado, e então, a voz de Patrícia retornou.

Oh, desculpe, é que a Sara estava surtando porque não encontrava o lápis de olho... O Louis não parecia muito feliz... Tudo bem? – a Paulistana, por um instante, sentiu a preocupação que Patrícia demonstrava arder. A garota era legal, Arely admitia, mas não queria que uma falsa amizade existisse entre elas. Mas era covarde demais para afastar as pessoas que se reuniam ao seu redor naturalmente com tão boa vontade.

— Ele estava adorável como sempre. – deixou a ironia exposta, e Patrícia riu, inconformada pela garota não demonstrar interesse no rapaz quando todas as demais fariam qualquer coisa por um pouco de atenção dele.

Trocaram mais algumas palavras, e Patrícia disse que a deixaria dormir.

Arely agradeceu, se enfurnando novamente na cama, pensando que seria bom sonhar com um belo Viking tirando-a daquela vida ao invés de sonhar estar se afogando. Realmente, seria muito bom... Embora paradoxal, considerando que estaria num barco no meio do oceano, correndo o risco de se afogar. Bem que Natasha falava que ela era contraditória...


Os pés mergulhados na água escura, vitórias-régias e outras plantas aquáticas espalhadas pelos lagos. Lagos rodeados de pedra talhada. Construção em ruínas. O teto tão alto que ela tinha certeza que abrigaria no mínimo quinze andares espaçosos.

E ali estava, ao lado dela, quem a salvara de morrer afogada, o rosto não mais encoberto em névoa, os olhos amarelados e brilhantes. Ele lhe parecia tão familiar...

Ele virou-se para ela e sorriu levemente. Era tão estranho ver um rosto de traços tão duros sorrir levemente... E ela quase podia ver as rugas ao redor dos olhos – mesmo parecendo ser só um pouco mais velho que ela. Sinais de que ele gostava de sorrir.

Notou que estavam com os dedos entrelaçados, as mãos apoiadas na coxa dele, o polegar daquela mão tão maior que a sua desenhando círculos preguiçosos entre o seu próprio polegar e o indicador.

— Eu acho que te conheço de algum lugar... – sussurrou bobamente. Ele sorriu novamente, os olhos brilhando de modo quente.

— Talvez... – sua voz soou enigmática, e enviou um calafrio de reconhecimento pela sua coluna. Sim, ela o conhecia... Mas de onde?

— Você poderia ser mais específico, não? – murmurou, ressabiada, e tudo que conseguiu foi um repuxar dos cantos dos lábios do estranho.

— Você vai lembrar... – ele limitou-se a falar, os lábios se repuxando um pouco mais num sorriso suave e tristonho.


A cabeça latejava um pouco, mas ainda assim, levantou-se. O rádio-relógio marcava onze horas. Riu de leve, trocando de roupa e então pegando o celular, descendo a escada. Tigrinho saldou-a com um miado leve, se esfregando em suas pernas. Riu de novo, pegando-o no colo.

— Seu chato. – Tigrinho parou de se esfregar contra sua bochecha, miou de modo contrafeito e voltou a se esfregar em seu rosto. – Tá, tá, faz o que quiser... – riu, derrotada. Era impossível resistir àquele felino.

Foi até a cozinha, colocando o gato em cima da mesa que ninguém usava e estava ali só pra ocupar espaço, enquanto procurava qualquer coisa que pudesse se passar por café da manhã e almoço ao mesmo tempo. Talvez torradas com requeijão do tipo cheddar...


Trocou de roupa no colégio mesmo, depois da aula, jogando a mochila no porta-malas e sentando na frente no Camaro vermelho. Gustavo o olhou, estranhando aquele ato que foi contra tudo que o patrão costumava fazer.

— Para o Santa Genoveva.

— Senhor...? – realmente, aquilo era ainda mais estranho. Ir para o aeroporto... Estaria o patrão pensando em fugir de casa?

— Tem alguns amigos chegando de São Paulo. Vamos buscá-los. – sorriu diplomaticamente para o confuso motorista. Gustavo foi imediatamente tranquilizado, e realizou o caminho por entre as ruas da cidade.

Louis apenas fechou os olhos, apoiando a cabeça contra o encosto do banco.

O tempo para joguinhos acabara. Não iria mais ficar fingindo naquele colégio idiota em meio à comida. Adrien conseguira burlar as barreiras que ele colocara na mente de Arely, entrar enquanto ela estava dormindo e aparecer em seus sonhos. Conseguira salvá-la num sonho que ditaria seu domínio sobre seu inconsciente. E a inimizade “natural” para com Ruby que ele conseguira plantar nela estava sumindo com a aproximação da Lycan. Tinha de agir rápido se quisesse começar a próxima batalha em vantagem...

E, se conseguisse começá-la em vantagem, talvez conseguisse ganhar a Guerra de vez.


Ria tranquilamente, sentada na calçada junto com Ruby em frente de casa. Detestava admitir, mas estava pegando carinho pela garota com apenas dois dias de conversa e, diferente de com as demais colegas, sentia vontade de travar amizade com ela.

A ruiva viera lhe passar as tarefas e trabalhos que perdera, e decidira ficar por ali, enrolando antes de ir pra casa.

— Então... Você realmente é de São Paulo? – o olhar de Ruby era desconfiado, e aquilo arrancou um riso de Arely.

— Sim; por quê? – Ruby começou a mexer de forma um tanto incomodada numa mecha do cabelo.

— Ah, bem... Sempre imaginei que paulistanos fossem uns idiotas convencidos que se acham os donos do Brasil, melhor que todos os demais, mais apressados que corredores de Fórmula 1 e sempre falando palavras chiques que você só entende se andar com um dicionário. – sorriu timidamente, mas a humana à sua frente sorriu de forma muito mais aberta. Chegou à gargalhar.

— Não vou mentir: alguns são assim. Geralmente, os patrões nas grandes empresas. Mas os adolescentes são normais até demais. E as “palavras complicadas” deles não estão num dicionário. – seu riso arrastou a outra garota, e logo ambas riam feito duas loucas com as costas apoiadas na parede. Se alguém perguntasse do que riam, não saberiam dizer. Apenas riam.


Louis jogou-se na espaçosa cama redonda que ficava em seu quarto, os três Bruxos que o acompanhavam se acomodando ao longo do quarto. O que aparentava ser o mais velho – uns dezoito anos, diriam – era magro de forma quase doentia, os cabelos loiro-areia e quebradiços, a pele amarelada e com aparência doente. Mas os olhos... Os olhos brilhavam azulados, cheios de vida, maldade e astúcia. Sentou-se no canto mais escuro do quarto, olhando com cara feia para o sol que se infiltrava pela janela e iluminava o quarto.

— Devíamos esperar o sol baixar, quando somos mais fortes. Não quero correr o risco de um Drachen ou de um Lycan espiando. – semicerrou os olhos, olhando reprovadoramente para o aparente descaso do anfitrião. Mas não foi Louis quem respondeu à sugestão.

Foi o aparentemente mais novo. Diriam ter no máximo treze anos. Cabelos enrolados em cachos bem tratados e negros, a pele colorida de uma criança que brinca muito ao sol, os olhos do mesmo tom do mais velho. Mas pareciam infinitamente mais cruéis e astutos. Tinha se jogado num pufe que encontrara perdido no closet. Um pufe cinza e que parecia grande demais para ele – o Bruxo quase sumiu ao afundar nele.

— Pare de reclamar feito o velho que é, Sandman... Os Lycans dessa cidade não ligam se tem até mesmo Ceifeiros matando à torto e à direito, desde que não se metam em seus assuntos e territórios. E Drachens não vão muito com qualquer lugar muito longe de florestas... Ficam concentrados na Amazônia e alguns em São Paulo por causa do que restou da Mata Atlântica... – a cabeça emoldurada por cachos negros apareceu, e sorria malignamente. – À menos que esteja com medo de se desentender comigo, apelarmos pra magia e você acabar perdendo... Saiba: nem de noite você é mais forte que eu, seu velho. – a cabeça voltou a sumir, e Sandman bufou.

O terceiro Bruxo, que aparentava cerca de quinze anos, girou os olhos também azulados, com o mesmo tipo de brilho que se encontrava no olhar dos outros, mas com outros: deboche, sarcasmo e cinismo. O cabelo cortado em estilo militar era tão negro quanto o do mais novo, e a pele era mais escura. Arrastou um edredom que parecia quente demais para aquela cidade para o chão ao lado da cama e enroscou-se nele feito um felino que encontrou um confortável lugar para dormir.

— Pare de provocar o Sandman, Sabri... Só até conseguirmos esse velho Líder. – a voz parecia sonolenta, e o Bruxo bocejou no meio da frase. Voltou a atenção para o Vampiro, que ainda não se pronunciara e apenas sorria levemente. Parecia se divertir com a pequena discussão. – É... Dessa vez você realmente se superou, Louis... Nada de salvar um rei e virar seu protegido, ou o filho de um nobre e ganhar um Feudo... Só casar a mãe com um burguês. – deu uma pausa, os olhos felinos e sonolentos aparecendo na borda da cama. – Adrien já sabe?

O sorriso tranquilo se desfez e se transformou numa careta azeda. A resposta estava clara. Sim, Adrien já sabia. Aquele maldito Observador não perdia nada desde que fora escolhido pela Catedral. Deviam ser aqueles malditos olhos amarelados que o tornavam o que ele era... Se Sadiqah não tivesse sido enganada pelos outros Observadores...

A cabeça de Sabri voltou a emergir do pufe, e parecia sério.

— Temos de agir logo. – franziu as sobrancelhas finas, fechando os olhos por um instante e então virou-se para o Bruxo enroscado no edredom. – Jabez, ela tem dois Guardiões que nem mesmo o Observador e os Lycans desconfiam.

Jabez ergueu a cabeça, ligeiramente mais acordado.

— Cachorros? Gatos? Ramsters? Porquinhos-da-índia? – fez uma pausa. – Cobras e Iguanas?

Sabri sorriu.

— Uma cachorra e um gato. Ambos mestiços.

Jabez uivou de prazer, se ajoelhando no chão.

— Grande! Grande! Ela deve ser realmente poderosa pra atrair dois mestiços de raças diferentes! – os olhos se arregalaram como olhos de cachorro sem dono. – E houveram outros, não houveram?

A cabeça do mais novo voltou a sumir.

— Sim. Quatro gatos, mestiços. Exceto pelo primeiro, todos com o mesmo sangue do atual. – riu de leve no fim. Tantos Guardiões em espírito para ela... Duas alternativas: ou ela era realmente poderosa e eles sentiam que ela precisava de proteção, ou alguém realmente se importava com ela e queria protegê-la à todo custo. Mais provavelmente, a primeira opção. – Jabez adoraria o desafio de deixá-la sem Guardiões: completamente vulnerável no plano espiritual. Completamente manipulável.

Louis fez um barulho de insatisfação.

— Por isso é tão difícil entrar em sua mente quando ela está em casa, e mais difícil ainda tentar controlar seu subconsciente... Dois Guardiões mestiços... Um Vampiro comum não conseguiria.

— Não mesmo... – foi Sandman quem falou, a voz sibilante. – Jabez, cuide dos Guardiões o mais breve possível. Quando eles não estiverem mais em nosso caminho, vamos providenciar que alguns humanos a sequestrem e tragam-na até nós.

Louis fez um muxoxo.

— Por que temos de mandar a comida ir buscá-la? Não era mais fácil Sabri manipulá-la e trazê-la?

— Porque nunca conseguiríamos sequer nos aproximar dela com todo um clã de Lycans vigiando-a. Sabri nunca conseguiria ficar à distância mínima necessária. Manipular a vontade de alguém é muito mais complexo do que simplesmente invadir e alterar seus sonhos para domar o inconsciente. – Jabez balançava a cabeça. – Até eu sei disso, Louis. – semicerrou os olhos. – Você está ficando velho e gagá, por alguma razão? – o Vampiro mostrou a cabeça para o Bruxo pela beirada da cama, uma sobrancelha levantada. O outro balançou os ombros e a cabeça, como quem diz “esquece”.

Ficaram em silêncio por um tempo, cada um pensando um pouco sobre o que já fora dito e decidido, até que Sandman voltou a se manifestar.

— Um lacaio localizou o Guardião... Na verdade, Guardiã.

Louis se ergueu, subitamente atento.

— E por que não mandou ninguém buscá-la ainda?! Com a Guardiã, nem precisaríamos de Mensageiros! Precisaríamos de ninguém, só dela!

Sandman bufou.

— Eu ia fazê-lo... Até você ligar e falar dessa Mensageira. O nome me pareceu familiar, e mandei o lacaio investigar as coisas dela. Ela e Arely são melhores amigas. – os olhos claros de Louis se abriram como pratos.

— Se conseguirmos corromper a Mensageira e trazer a Guardiã para o nosso lado... A amizade delas tornaria tudo mais fácil...

Sabri o interrompeu, levantando a cabeça, vislumbrando Jabez dormindo e erguendo uma sobrancelha. Seu irmão mais velho nunca ligara muito para o planejamento. Era um raro Bruxo que preferia apenas atacar e agir. E não mudara naqueles três mil e quinhentos anos como Bruxo.

— Na verdade, eu impedi o Sandman quando fiquei sabendo. Mesmo que a Guardiã viesse para o nosso lado, se viesse antes de Arely, ela se voltaria contra nós se não corrompêssemos a Mensageira. Ao que parece, ela considera muito a opinião dela sobre quem é ou não confiável. Por isso, temos de trazer primeiro a Mensageira para o nosso lado.

Louis semicerrou os olhos. E se já houvesse algum Observador entrando em contato com a Guardiã?

— Não há riscos de um Observador alcançá-la antes? – virou-se para Sandman, que sorriu de um jeito macabro.

— Os Observadores vêm diminuindo, Louis... Os últimos escolhidos foram um Lycan chamado Alexandre e um Drachen chamado Jean... Quarenta anos atrás. Eles precisam concentrar seus integrantes nos locais mais prováveis de existirem os velhos Líderes e Guerreiros. Não é mais como cem anos atrás, onde havia no mínimo um em cada colégio de cada cidade de cada país, principalmente porque conseguimos matar muitos desde aquela época. Há um Drachen que desconfia, mas não pode se aproximar demais porque ela vai de van para o colégio, não sai muito sozinha de casa e o colégio onde ela estuda não é tão fácil de entrar, ainda mais para um Drachen claramente puro... E ele tem mais coisas com as quais se preocupar, pelos relatórios que me chegaram.

Louis ouviu aquelas palavras atentamente. Quarenta anos atrás, apenas dois Observadores recrutados, e vários Observadores mortos desde um século atrás... Quando Adrien fora escolhido, eram cinco escolhidos por ano, em média, e apenas algumas mortes. Aquelas coisas deviam demonstrar como Lycans e Drachens estavam com suas esperanças minadas... Outra vantagem.

— E em que colégio ela estuda? – não resistiu perguntar. Foi Sabri quem respondeu, sem levantar a cabeça.

— Dante Alighieri. – Louis sorriu o maior sorriso que dava em dias.

Uma velha Guerreira com sangue Italiano que estudava no Dante Alighieri... É, o Drachen teria problemas para alcançá-la.

Levantou e fechou a cortina, o quarto ficando na penumbra.

— Melhor dormirmos, meus caros... Teremos um mês bem agitado...


Arely e Ruby agora faziam uma das tarefas – de Física –, enquanto discutiam alguma coisa qualquer sobre a história de Dragon Age – a paulistana ficara muito surpresa ao saber que Ruby também era fã do jogo. Mas alguém as interrompeu.

— Ruby... Arely. – a humana sentiu os lábios se desprenderem.

Era o cara do seu sonho, tinha certeza. Percebeu os olhos amarelados relampejarem em sua direção, um brilho estranho tremeluzindo no bronze líquido.

Percebeu Ruby ficar atenta, e então, uma súbita vontade de sumir a invadiu. De correr.
De fugir.

Murmurou uma despedida para Ruby, recolheu suas coisas e entrou, se perguntando como aquele estranho sabia seu nome.

Deixou suas coisas na poltrona mesmo e dirigiu-se até a escada, pretendendo ir até o quarto e dormir um pouco, mas estancou com o pé direito no primeiro degrau.

Levou as mãos à cabeça, sentindo-a latejar.

E quando as imagens de quilômetros de distância começaram a se sobrepor às do que estava à sua frente, entendeu o que acontecia.


— Não... De novo não... – murmurou antes de cair, inconsciente.

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